sexta-feira, 27 de junho de 2008

Ratzel x Vidal - HPG

Ratzel

Friedrich Ratzel nasceu em 30 de Agosto de 1844, em Karlsruhe na Alemanha onde começou sua carreira intelectual licenciando-se em farmacêutica e Zoologia.

Depois de terminar o curso na Universidade de Heidelberg, publicou, em 1869, o seu primeiro livro - um texto sobre Darwin e a Teoria da Evolução.

Em 1870 se alistou nas tropas alemãs na Guerra Franco-Germana.

Ratzel fez várias viagens que fariam dele um geógrafo (como por exemplo: Itália, Estados Unidos da América, China). As primeiras viagens foram ao longo do Mar Mediterrâneo, sobre as quais publicou relatos no Kölnische Zeitung, jornal que lhe possibilita emprego como jornalista e repórter de turismo, obtendo, desta forma, os meios necessários para viajar pelo mundo.

Em 1874 Ratzel desloca-se aos Estados Unidos e México numa viagem decisiva para sua carreira; ele dedicou ao estudo da colonização alemã nos Estados Unidos e no resto da América do Norte, especialmente na região centro – oeste do continente, chegando à conclusão que o homem vivia sujeito às leis da natureza com propagação das ideias deterministas”. Ratzel sugeria a existência de uma grande influência do meio natural sobre o homem.

Após essa visita que são publicados os seus dois grandes trabalhos geográficos: “Quadros das cidades e da civilização norte-americanas” (1874) e “Os Estados Unidos do Norte da América” (1878-80)

Antes, em 1868, já havia publicado “O Ser e o Devir no Mundo Orgânico”, e mais tarde Quadros da Guerra com a França”, no qual relata a campanha militar alemã na guerra de 1870/71 com a França.

Em 1875 regressa à Alemanha e torna-se professor de Geografia na Universidade de Munique, sendo mais tarde promovido a professor com “livre - docência”.

Em 1882 é publicada a obra “Antropogeografia”, abordando a evolução dos povos da Terra, as relações entre a civilização e aspectos de natureza demográfica e os métodos de representação cartográfico das deslocações humana, e, em 1897, “Politische Geographie” (Geografia Política), na qual relata a geografia dos Estados, do comércio e da guerra, que mais tarde, no início do século XX, vem a servir de inspiração ao cientista político sueco Rudolf Kjellén, no surgimento do termo "Geopolítica".

Friedrich Ratzel é considerado o fundador da Geopolítica Alemã.

Ratzel morre no dia 9 de Agosto de 1904 na cidade alemã de Ammerland. Após a sua morte as suas obras influenciaram uma série de autores que lhe sucederam, como Rudolf Kjellén, Karl Haushofer e Mackinder

Contexto Histórico

Ratzel desenvolve o seu pensamento num contexto nacional e internacional muito próprio, em que a Alemanha, liderada por Bismarck, unificava-se como Estado e assume-se como potência mundial.

Filosoficamente, a Alemanha era a síntese do primado da razão de Kant, do determinismo e materialismo histórico de Hegel e do romantismo místico e nacionalista de Herder, Fichte e Treitschke”.

Se durante aquele período o poder ficara nas mãos dos grandes proprietários das terras (representantes da ordem feudal) e disperso pelas várias unidades confederadas, com a tardia adoção das novas medidas capitalistas condicionava-se o desenvolvimento econômico, social e político da Alemanha, em contraste com os países mais desenvolvidos da época.

É com a vitória da Prússia sobre a Áustria, na Guerra Austro – Prussiana, que a Prússia se torna a potência hegemônica na Alemanha. A fase seguinte consistiria em fazer com que outros estados aderissem ao seu projecto de guerra contra a França por esta se opor à integração dos Estados do sul na unificação e formação do novo país. Conseguiu-o plenamente, também derrotando a França e Napoleão III. O chanceler prussiano Bismarck inicia, assim, o processo de unificação da Alemanha

Com os novos ideais nacionalistas que se espalhavam por toda a Europa e com a afirmação dos Estados e dos Impérios coloniais, as características do novo Estado Alemão, ou seja, uma organização militarizada da sociedade e do Estado herdada da Prússia e um expansionismo latente, podem ser explicadas pela situação da Alemanha no contexto europeu. Isto é, o país emerge como mais uma unidade do capitalismo, só que sem a presença de colônias, como a França, Holanda, Inglaterra e Portugal, em que estes eram detentores de impérios coloniais. Desta forma, havia uma necessidade de expansionismo à medida que procedesse ao seu desenvolvimento interno.

A solução era então abrir território mediante suas fronteiras. A crise econômica verificada em 1873, após a vitória sobre a França de Napoleão, faz nascer a ambição de procurar espaços para se expandir.

O capitalismo alemão carecia de soluções práticas. Havia a necessidade de recorrer à geografia como forma de resolver o problema.

Nos finais do século XIX, a escola alemã de geopolítica tem em Friedrich Ratzel o seu grande mentor. Para analisar a filosofia de Ratzel é necessário estudar o contexto histórico da época em que se insere. Tem por base o nacionalismo da época.

O pensamento de Ratzel assenta em “ O Estado como organismo ligado ao solo” (…), “A vida da humanidade sobre a terra parece-se com a de um ser vivo: avança, recua, retrai-se, engendra novas relações, desfaz as antigas, tudo isto segundo modelos que se assemelham aos que tomam forma nas outras espécies vivas.”

Para Ratzel a Alemanha deve ter uma política mundial. Deve criar um Império colonial à medida das suas ambições - para que uma potência seja mundial, convêm que esteja presente em todas as partes do universo conhecido e designadamente em todos os lugares estratégicos. Estamos no tempo do congresso de Berlim de 1885, onde as potências partilharam as colónias em África”.

Existindo a necessidade de encontrar um caminho para resolver o problema da Alemanha, Ratzel querendo responder aos líderes alemãs decepcionados com os geógrafos universais propõe-lhes uma solução. A ciência política e a geografia devem ser coadjuvantes por forma a lançar uma base sólida na procura do espaço vital” para a Alemanha.

O Espaço (Raum) é a noção chave que inspira os desígnios e as políticas do Estado Alemão. O Estado vive como um organismo vivo. Ele nasce, cresce e desenvolve-se, atinge a sua maturidade antes de envelhecer e morrer”. E tal como o ser vivo o Estado também entra em conflito para tirar melhor proveito dos recursos limitados.

No pensamento do geógrafo alemão, o “Estado sofre as mesmas influencias que qualquer forma de vida”. O Estado deve desenvolver-se no espaço e enraizar-se para se afirmar e subsistir. O domínio dos recursos naturais e das matérias-primas é fundamental. É da natureza dos Estados desenvolverem-se e entrarem em competição com os Estados vizinhos. A disputa do território e a permanente alteração das fronteiras é desejável e vista com naturalidade.

Os discípulos da Escola Determinista foram além das proposoções ratzelianas, chegando a afirmar que o homem seria um produto do meio. Defendiam que um meio natural mais hostil proporcionaria um maior nível de desenvolvimento ao exigir um alto grau de organização social para suportar todas as contrariedades pela natureza (principalmente os rigores do inverno).

Desse modo, haveria uma explicação para o desenvolvimentodas sociedade européias, que não tiveram grandes dificuldadesem subjugar os povos tropicais mais indolentes e atrasados, teoria que justificou o expansionismo neocolonialentre o fimdo século XIX e o ínicio do século XX. Essas idéias seriam, mais tarde, aproveitadas pelos cientistas da Alemanha Nazista.

Influências

Ratzel foi influenciado pela Teoria da Evolução de Charles Darwin, e deduzia que a luta entre as espécies se dava basicamente pelo espaço, o que também se aplicaria à humanidade. Nesse sentido, os homens procurariam organizar o espaço para garantir a manutenção da vida. O maior sinal da decadência de uma sociedade consistiria na perda do território, enquanto o expansionismo seria algo inevitável para uma sociedade que estivesse progredindo.

Vidal

Paul Vidal de La Blache (1845 - 1918), geógrafo francês nascido em Pézenas, Hérault, considerado o fundador da geografia francesa moderna e da corrente francesa de geografia humana. Estudou história e geografia na École Normale Supérieure, em Paris, e ensinou por três anos na Grécia. Após várias viagens pelo mundo retornou à França, para ser professor da École Normale (1877-1898). Fundou e editou a revista Annales de Géographie (1891), ainda hoje o mais importante periódico de geografia da França. Assumiu o cargo de professor de geografia na Sorbonne (1898-1918), onde trabalhou até o fim da vida, morrendo em Tamaris-sur-Mer, Var.

Defendia uma geografia regional baseada no intensivo estudo de regiões fisicamente pequenas definidas como os cantões da França, e do inter-relacionamento das pessoas com o seu ambiente. Pregou uma teoria de que estudos de partes isoladas da Terra não têm importância, e que existiria um contínuo jogo de ação, reação e interação entre grupos humanos e seus ambientes naturais. Considerado o expoente máximo da geografia francesa, autor de um Atlas générale, do primeiro volume da Histoire de France (1903), de Ernest Lavisse, do póstumo Tableau de géographie humaine (1921), além de criador do Possibilismo Geográfico.


Contexto Histórico

A França unifica-se precocemente, nos idos de , e o poder era centralizado, com a prática da monarquia absolutista;

A Revolução Francesa, em 1789, enterra definitivamente o poder dos senhores feudais e fortifica a ascensão da burguesia, a qual se solidifica no poder. Nesse processo, o pensamento burguês gerou propostas progressistas, instituindo uma tradição liberal no país.

Outro aspecto importante foi o caráter revolucionário do capitalismo na França, o qual ampliou a representação e o espaço da ação política.

A França foi o país que demonstrou, de modo mais claro, as etapas de avanço, domínio e consolidação da Sociedade burguesa. Porém, a via de realização desse processo deixou uma herança bastante distinta da encontrada na Alemanha, principalmente no aspecto ideológico. A Geografia foi uma das manifestações dessas diferenças.

Em 1870, a França era governada pelo imperador Napoleão 3º, sobrinho de Napoleão Bonaparte. Além de exercer uma política imperialista estabelecendo colônias na Ásia e na Costa da África, Napoleão 3º pretendia transformar a França na primeira potência do continente europeu. Suas ambições chocaram-se com as do primeiro ministro da Prússia, Otto Von Bismarck, que realizou a primeira unificação da Alemanha.

Bismarck provocou uma guerra contra a França para obter as regiões da Alsácia e Lorena, situadas na fronteira francogermânica, ricas em ferro, elemento precioso para o desenvolvimento da ascendente indústria alemã. A derrota francesa consolidaria a unificação alemã.

No plano interno francês, uma parte significativa da burguesia, cansada das vaidades de Napoleão 3º, e o proletariado de tendências socialistas, oprimido pelas práticas do capitalismo 'selvagem', resolveram proclamar a República cujo objetivo imediato era impedir a entrada das tropas alemãs em Paris.

Para resistir ao inimigo, os parisienses alistaram-se em massa na Guarda Nacional. Os alemães cercaram Paris. Os republicanos resistiram tenazmente, porém, em outra frente da guerra, uma ala numerosa do exército francês rendeu-se em Metz, na divisa entre França e Alemanha. Com isso, a burguesia apressou-se em negociar um armistício com os alemães, que foi assinado em janeiro de 1871.

A vitória alemã significou a humilhação da França, que perdeu as ricas regiões da Alsácia e Lorena, nascendo o ideal de revanchismo contra a Alemanha, uma das principais marcas da Terceira República criada em 1870.

Foi nesse período que a Geografia Francesa se desenvolveu, com o apoio deliberado do Estado Francês. Esta disciplina foi colocada em todas as séries do ensino fundamental, na reforma educacional efetuada neste período.

A guerra havia colocado para a classe dominante a necessidade de se pensar o espaço, de fazer uma Geografia que desligitimasse a reflexão geográfica alemã e, ao mesmo tempo, fundamentasse o expansionismo francês.

Ratzel x Vidal

O pensamento geográfico francês nasceu com a tarefa de deslegitimar a reflexão geográfica alemã segundo Ratzel, tendo como principal artífice Vidal de La Blache.

As propostas de Vidal contrapõem as de Ratzel (autoritarismo) pois manifesta um tom mais liberal, apresentando várias críticas ao pensamento de Ratzel, tais como: não misturar ciência e política; deixar o caráter exclusivamente naturalista, adotando a idéia de que o homem faz parte do processo geográfico interferindo na paisagem e modificando-a; ataque à concepção fatalista e mecanicista, propondo uma postura relativista. Em termos de métodos sua proposta não rompeu com as formulações de Ratzel, foi antes um prosseguimento destas.

Ele buscou estabelecer princípios básicos em que a geografia deveria assentar: a unidade dos fenômenos terrestres; a combinação variável desses fenômenos; o laço da geografia e todo os fenômenos da superfície da terra; o reconhecimento da influência do meio e a sua relação com o homem; na necessidade de um método científico para definir e classificar os fenômenos; e o reconhecimento do papel do homem na modelagem do meio geográfico.

A geografia humana aproxima-se da sociologia, uma vez que coloca de lado o indivíduo dando mais ênfase à comunidade. Para Vidal, era necessária uma união da sociedade, pois assim as dificuldades seriam superadas. O homem não age e não vale geograficamente, senão por grupos, é desta forma que ele atua na superfície da Terra. Não é possível, entretanto, entender a vida dos grupamentos humanos sem entender como e porque surgem nesta ou naquela região. La Blache escreveu que o estudo da Geografia era o estudo dos lugares e não dos homens. Mostra como o homem, desde épocas imemoriais, soube tirar proveito do meio, isto é, da natureza. Criou técnicas, hábitos, foi guiado por um desejo de apropriação a um fim determinado. Os instrumentos que o homem colocou no trabalho,derivam de intenções e de esforços coordenados, aos quais Vidal denominou "gênero de vida". Segundo ele, a terra não determina o comportamento do homem. Apenas oferecem-lhe oportunidades: o homem é quem faz a escolha.

Ao rejeitar o determinismo ambientalista, seu ponto de vista é denominado de possibilismo, mas não queria dizer que o homem é um agente livre para quem tudo é possível. Reconheceu plenamente que a escolha do homem é severamente limitada pelo sistema de valores de sua sociedade, sua organização, tecnologia, em suma pelo que chamava modo ou gênero de vida do homem. Vemos aí uma controvérsia, sutil, do discurso de Vidal, que critica o expansionismo alemão ao passo que legitima a ação colonial francesa.

A partir das suas formulações, os geógrafos seguintes se tornam influenciados, chegando a ter numerosos discípulos diretos. Alguns tentaram completar a obra de La Blache, enquanto outros tomaram seus fundamentos e desenvolveram propostas próprias, temos ainda, os que enfocaram um ponto específico da proposta vidalina e, autores que criaram polêmica diante de algumas colocações de La Blache.

Por ter planejado uma obra coletiva, a Geografia Universal, houve uma aproximação dos seus discípulos, uma vez que, cada um escreveu sobre uma determinada porção do planeta, explicitando o conceito de "região", vislumbrado por La Blache. Denominaram região, como sendo uma unidade de análise geográfica, que exprimiria a própria forma dos homens organizarem o espaço terrestre. Não seria apenas um dado teórico de pesquisa, mas também um dado da própria realidade. A função do geógrafo seria delimitá-la, descrevê-la, e explicá-la. Com Vidal e, a partir dele, o conceito de região passou do sentido geológico de parcela da superfície terrestre, para um conceito mais humanizado, sendo compreendida como um produto histórico, que expressaria a relação dos homens com a natureza. Tal concepção dera origem a uma nova perspectiva do pensamento geográfico: a Geografia Regional.

Tratava-se de um estudo minucioso das regiões, gerando um considerável acervo de análises locais. Para isso, empregavam conhecimentos cartográficos, discutiam a formação histórica, a estrutura agrária, urbana e industrial (quando esta existisse na região analisada). Esta perspectiva se difundiu bastante, enfocando regiões de todos os quadrantes da Terra. Isto gerou um acúmulo de informações que propiciou o aparecimento de especializações para cada área estudada, como, a constituição de uma Geografia Agrária, Geografia Urbana, e assim por diante.

Devido sua formação de historiador, La Blache, deixou também influências no pensamento destes, principalmente nos de língua francesa. Assim, da proposta vidalina, desdobrou-se também uma Geografia Histórica.


Bibliografia

RATZEL, F. – Sociedade, Estado e Território (trecho da obra Antropogeografia vol.1, 1882)

RATZEL, Friedrich - O Solo, a Sociedade e o Estado

VIDAL DE LA BLACHE, Paul – Significados e objeto da Geografia Humana

BASSIN, Mark – Friedrich Ratzel – 1844/1904

MORAES, Antônio Carlos R. – Vidal de La Blache e a Geografia Humana

2 comentários:

Fernando Rodrigues Felix disse...

Parabéns pelo seu artigo sobre Ratzel e Vidal de La Blache, muito bem escrito e com rica bibliografia.

Anônimo disse...

Moça, vc salvou o meu trabalho...rsrs

Artigo muito bom.